quarta-feira, 6 de janeiro de 2016

O protesto do cheque após transcorrido o prazo de sua apresentação

O protesto do cheque após transcorrido o prazo de sua apresentação

Publicado por Selito Maciel Kukul - 2 horas atrás
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Profissionalmente temos enfrentado em nosso escritório demandas de cunho indenizatório, que tem por fundamento o protesto de cheque fora do prazo do art. 48 da Lei 7.357/1985, contudo, temos razões para acreditar que tal dispositivo não possui o condão de vedar o protesto do cheque após o prazo de sua apresentação.
É verdade que a jurisprudência pátria não é uníssona sobre o assunto, entretanto, parece mais correta e justa a posição inclinada em reconhecer a possibilidade do protesto, posição esta adotada por grande parte dos tribunais.
Tal entendimento tem fulcro no fato de que a Lei 7.357/85, não trata em momento algum de prazo para o protesto do cheque contra o emitente.
O art. 48 da Lei 7.357/85, mencionado acima não pode ser lido de forma isolada, ignorando o que dispõe o art. 47 do mesmo diploma, ao qual faz referência expressa.
Importante transcrevê-los para fins de melhor entendimento:
Art. 47 Pode o portador promover a execução do cheque:
I - contra o emitente e seu avalista
II - contra os endossantes e seus avalistas, se o cheque apresentado em tempo hábil e a recusa de pagamento é comprovada pelo protesto ou por declaração do sacado, escrita e datada sobre o cheque, com indicação do dia de apresentação, ou, ainda, por declaração escrita e datada por câmara de compensação. (grifamos)
Art. 48 O protesto ou as declarações do artigo anterior devem fazer-se no lugar de pagamento ou do domicílio do emitente, antes da expiração do prazo de apresentação. Se esta ocorrer no último dia do prazo, o protesto ou as declarações podem fazer-se no primeiro dia útil seguinte.
Destarte, para nós, se depreende da leitura dos artigos acima, que a referência do art. 48 é específica ao inciso II do artigo 47 (que trata da execução contra endossantes e seus avalistas), única parte do dispositivo que faz menção a protesto e declarações.
Entendemos que, se quisesse o legislador estabelecer prazo para o protesto também em relação ao emitente, o teria feito expressamente.
Desse modo, a interpretação conjunta destes dispositivos legais leva, inexoravelmente, à conclusão de que o prazo estabelecido no art. 48 para protesto é estabelecido apenas contra os endossantes e seus avalistas, mas não contra o emitente. Não há, em toda a lei do cheque, qualquer prazo para protesto do título em face de seu emitente.
Além disso, a prescrição do título não fulmina o crédito nele representado, que pode ser buscado de outras maneiras, ficando apenas vedada a utilização do processo executivo.
Isso é relevante para o estudo porque a Lei nº 9492/1997 estabelece que "o protesto é o ato formal e solene pelo qual se prova a inadimplência e o descumprimento de obrigação originada em títulos e outros documentos de dívida". O cheque prescrito se enquadra na segunda hipótese documento de dívida.
Nesse sentido, o Min. Massami Uyeda bem tratou da questão no julgamento do Recurso Especial nº 369.470/SP:
"No tocante aos arts. 162 do CC303III, do CPC e 59 da Lei n. 7.357/85, bem de ver que, do ponto de vista processual, não há óbice a que o devedor - ao se servir de ação destinada a obter a declaração de inexistência de relação jurídica e, consequentemente, o cancelamento do protesto - argua, a qualquer momento, a ocorrência de prescrição da própria dívida em proveito da sua pretensão. É que, com a prescrição do débito, o crédito se desveste da sua exigibilidade jurídica e se convola no que a doutrina designa de" obrigação natural "(na qual há vínculo jurídico, sem a obrigação propriamente dita, ou seja, sem o direito de ação).
Não sucede o mesmo com a alegação de prescrição da ação executiva do título de crédito protestado, pois a exigibilidade da dívida mencionada no título de crédito permanece hígida com a prescrição cambial. De fato, a prescrição cambial despoja o crédito somente da ação executiva, de sorte que a satisfação dessa obrigação poderá ser buscada por outra via judicial (por exemplo, a ação monitória) ou extrajudicial (como o protesto).
Recorda-se, por oportuno, que, à luz do art. 1º da Lei de Protestos (Lei n. 9.492/97), o protesto não se restringe a títulos executivos, mas a"títulos e outros documentos de dívida", razão por que a eventual perda do atributo de executividade pelo cheque não importa, ipso jure, o cancelamento do protesto". (STJ, REsp 369.470/SP, rel. Min. Massami Uyeda, julgado em 10/11/2009)(grifamos).
A jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná também figura neste sentido, pois em inúmeros julgados foi reconhecida a possibilidade de protesto de cheque prescrito:
"APELAÇAO CÍVEL - DECLARATÓRIA DE INEXIGIBILIDADE DE TÍTULO DE CRÉDITO C/C INDENIZAÇAO POR DANOS MORAIS - PROTESTO DE CHEQUE PRESCRITO - POSSIBILIDADE - EXERCÍCIO REGULAR DE UM DIREITO DO CREDOR - INEXISTÊNCIA DE ATO ILÍCITO A ENSEJAR O DEVER DE INDENIZAR - PRECEDENTES - RECURSO DESPROVIDO. 1. A prescrição do cheque de que trata o art. 59 da Lei 7.357/85 apenas lhe retira a eficácia executiva, não fulminando o próprio crédito, que mantém sua exigibilidade.(TJ/PR, 13ª C. Cível, Apelação nº 866.902-7, rel. Des. Cláudio de Andrade, julgado em 20/06/2012).
No mesmo sentido:
APELAÇAO CÍVEL - CANCELAMENTO DE PROTESTO INDEVIDO - ALEGAÇAO DE IMPOSSIBILIDADE DE PROTESTO DE CHEQUE PRESCRITO - TESE INSUSTENTÁVEL - PROTESTO ACEITO - RESTRIÇÕES SOMENTE EM FACE DO ENDOSSANTE E DO AVALISTA - POSSIBILIDADE EM FACE DO EMITENTE - RECURSO DESPROVIDO"(TJ/PR, 7ª C. Cível, Apelação nº 903.132-7, rel. Des. Luiz Antônio Barry, julgado em 19/06/2012.)(grifamos).
No mesmo norte é o entendimento do Tribunal de Justiça do estado do Rio Grande do Sul:
CHEQUE. PRAZO PARA PROTESTO. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. - A possibilidade de efetivação do protesto, no caso de cheque, vai até o final do prazo prescricional da cártula, pois se trata de protesto voluntário, cujo aponte é regular e legítimo, servindo para constituir prova oficial da mora, visando, inclusive, assegurar o direito de regresso contra os coobrigados. - Prazos estabelecidos nos arts. 33 e 48 da lei do Cheque referem-se ao protesto necessário e não ao voluntário. - Litigância de má-fé afastada devido à pretensão da autora ser com base em suporte legal. RECURSO DA DEMANDADA PROVIDO E DESPROVIDO O DO AUTOR. (Recurso Inominado nº. 71001354778/RS, Rel. Des Carlos Eduardo Richinitti).
No mesmo sentido:
AÇÃO INDENIZATÓRIA. CHEQUES. PROTESTO. PRAZO IDÊNTICO AO ESTABELECIDO PARA O AJUIZAMENTO DA AÇÃO EXECUTIVA. AUSÊNCIA DE IRREGULARIDADE. DANO MORAL INOCORRENTE. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. (Recurso Inominado Nº 71002745552/RS Rel.: Vivian Cristina Angonese Spengler)
Do entendimento acima não destoa o Egrégio Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro e o Tribunal de Justiça de São Paulo, vejamos:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. PROTESTO DE CHEQUE. ATO LEGÍTIMO DE COBRANÇA, DENTRO DO PRAZO PARA A PROPOSITURA DE AÇÃO JUDICIAL. EXERCÍCIO REGULAR DE DIREITO. DANO MORAL INEXISTENTE. REFORMA DA SENTENÇA. A perda da força executiva do cheque, pelo decurso do prazo da ação prevista no artigo 47, da Lei 7.357/85 (Lei de Cheques), não se confunde com a prescrição da própria dívida, que ainda pode ser objeto de cobrança fundada na relação causal de direito material, cujo prazo prescricional se dá pelo Código Civil. Na hipótese, a dívida subsiste e não foi paga, não havendo ilícito por parte do credor que procedeu ao protesto. Nesse sentido é a jurisprudência do STJ, no sentido de que "o cheque prescrito serve como instrumento de ação monitória" (STJ-3ª turma, AI 666.617, DJU 19.03.07). Recurso a que se dá provimento, monocraticamente, na forma do art. 557, § 1º-A do CPC. (TJ-RJ - APL: 3510212220098190001 RJ 0351021-22.2009.8.19.0001, Relator: DES. CLAUDIA PIRES, Data de Julgamento: 31/05/2011, SEXTA CÂMARA CIVEL).
No mesmo norte:
CHEQUE - DECLARATÓRIA DE NULIDADE - PROTESTO DE TÍTULO - POSSIBILIDADE DE PROTESTO DE CHEQUE PRESCRITO DENTRO DO PRAZO DE DOIS ANOS APÓS O PRAZO DE SEIS MESES PARA A SUA EXECUÇÃO - Interesse jurídico do credor em efetivar o protesto para manter a autonomia do cheque, ou seja, para não ter de comprovar a causa debendi - Ônus do devedor de indicar na exordial e comprovar os elementos que levariam à anulação do título - Ônus que restou descumprido pela autora - Improcedência mantida - Nega-se provimento ao apelo. (TJ-SP - APL: 7241115300 SP, Relator: Richard Paulro Pae Kim, Data de Julgamento: 19/11/2008, 21ª Câmara de Direito Privado E, Data de Publicação: 28/11/2008)
Desta forma, salvo melhor juízo, resta claro que o prazo mencionado no art. 48 da Lei7.357/1985 restringe-se ao endossante e ao avalista, não aproveitando ao emitente, que poderá ter o cheque, por ele emitido, protestado, mesmo após prazo para apresentação.

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